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Personagens descartáveis

  • Foto do escritor: Micaela Crispim
    Micaela Crispim
  • 1 de ago. de 2021
  • 7 min de leitura

Atualizado: 5 de ago. de 2021

Tudo bem, eu admito que o título descartável é um pouco pesado. Mas não, eu não estou falando de personagens que eu gostaria que não existissem! E sim daqueles que aparecem só uma vez e depois ficam com Deus. Quantas vezes você já leu uma história da MSP com um figurante que nunca mais deu as caras, por mais cativante que ele fosse? Os ditos "personagens descartáveis" aparecem com bastante frequência, principalmente na turminha clássica. Do ponto de vista da criação de uma história, usar secundários nunca vistos antes e que nunca serão vistos depois tem seus prós e contras.


Uma das principais vantagens é que um personagem inédito pode ter a personalidade e as características que o seu roteiro precisar. Por exemplo, digamos que eu queira contar uma história em que a Magali aprende a ser menos egoísta depois de provar do seu próprio remédio, ou seja, alguém mais faminto do que ela começa a pegar sua comida. Esse esfomeado poderia ser a Mônica, o Jeremias ou qualquer outro personagem já conhecido? Bem, isso não faria muito sentido, né? Nós sabemos que ninguém no Limoeiro consegue comer mais do que a Magali. É claro que eu poderia escrever que o Franjinha inventa uma fórmula para estimular o apetite do Dudu, mas outra pessoa bebe por acidente e passa a ter uma gula sem fim, só que isso acaba gastando mais páginas do roteiro. Além disso, alguns podem considerar usar as invenções do Franjinha somente para mover a história como um clichê.


Nesse caso, o que eu posso fazer? Usar um personagem descartável! É simples e prático. Em poucos quadrinhos é possível introduzir o Figurantezinho, um garoto que se mudou para o bairro do Limoeiro e que tem uma fome insaciável, ainda maior do que a da Magali. A partir daí, posso desenvolver minha história tranquilamente: a Magali sente na pele o que é ter sua comida roubada e aprende a dividir com os amigos. Fim!


Opa! Mas e o Figurantezinho? O que acontece com ele? Ter um personagem mais esganado do que a Magali não gera grandes repercussões? Se pararmos pra pensar, no exemplo acima eu não "resolvi" o problema do egoísmo da Magali, apenas transferi ele para o Figurantezinho. A partir dessa história, os próximos roteiros teriam que mostrar o Figurantezinho uma hora ou outra, e caso ele continuasse morando no bairro, os outros personagens teriam que fugir dele do mesmo jeito que fugiam da Magali antes.


Acontece que na turminha temos pouca ou nenhuma continuidade, já que as histórias existem há décadas e são escritas por inúmeros roteiristas. Seria impossível criar roteiros bem estruturados e conectados depois de todos esses anos. Além disso, a graça é justamente você poder pegar qualquer gibi, ler e entender tudo, sem precisar de um contexto. Nós sabemos as características básicas dos personagens e isso basta pra compreender a história.


Logo, adicionar o Figurantezinho à galeria de personagens fixos não parece ser uma boa ideia. Imagina só se eu tiver que desenvolver todos os figurantes como um carteiro, sorveteiro ou quem quer que seja. Evitar que eles apareçam nas próximas edições poupa muito trabalho. Pra "me livrar" do Figurantezinho é só dizer que ele veio visitar um primo durante o final de semana, ou que ele estava passando de bobeira pelo bairro, mas já está de saída.


Certo, mas se eu sempre usar personagens descartáveis acabo tendo outro problema: com tanta gente nova aparecendo nas redondezas, os leitores vão começar a se perguntar se o Limoeiro é um bairro, uma cidade ou um país. Não faz sentido que nenhuma pessoa apareça mais de uma vez, afinal todos moram na mesma vizinhança e vão acabar se esbarrando de vez em quando. Também é necessário expandir a quantidade de personagens secundários fixos pra que eles possam contracenar com os principais.


Quando a Mônica foi criada, em 1963, o Cebolinha era o protagonista das tiras de jornal e todos os seus coadjuvantes eram do sexo masculino. A Magali surgiu no ano seguinte devido à falta de meninas na turma. Com o passar do tempo, já nos gibis da editora Abril, Cascuda e Aninha foram criadas, mas apenas para serem as namoradas do Cascão e do Titi, respectivamente. Elas praticamente não interagiam com a Mônica e com a Magali. Então, sempre que o roteiro pedia uma garota para ser interesse amoroso do Cebolinha, por exemplo, ou para brincar com as meninas, surgia uma figurante sem muita importância que era descartada rapidamente.

Obs: vale lembrar que naquela época a Marina, Dorinha e Milena (entre outras) nem sonhavam em existir! Se você quiser saber mais sobre a primeira aparição dos personagens da MSP, confere esse post aqui.

Foi assim que surgiu a Denise, em 1989, criada pela Rosana Munhoz na história A fina. Apesar de não ter uma aparência definida na época (isso só foi resolvido em 2000, com a história O concurso das Denises! do Emerson Abreu), a Denise cumpriu o seu papel com maestria: ela era a amiguinha da Mônica e da Magali se necessário. E quando o roteiro pedia uma menina pra ser o interesse amoroso dos rapazes, ou simplesmente uma patricinha? A mesma coisa acontecia: uma garota bonitinha e/ou esnobe era criada somente para esse propósito (às vezes sobrava pra Denise ser a antagonista), até que a Carminha Frufru estreou em 1993. Desde então, ela assumiu o cargo duplo de bela & metida.

Trecho da Webcomic da Denise


Ao ver um "inho" aparecendo no bairro, é fácil imaginar qual vai ser o papel dele no roteiro, e você provavelmente já sabia disso antes mesmo de ler esse post. Basicamente, os "inhos" (Rodriguinho, Renatinho, Davizinho, etceterainho) são a versão feminina da Carminha Frufru. Eles podem ser o menino rico e arrogante da vez, o interesse amoroso das meninas, ou os dois. São tantos e a fama deles é tão grande que existem as páginas Todo dia a Mônica apaixonada por um "inho" e Aff, é inho no Facebook. Depois de um tempo o Fabinho Boa-Pinta apareceu pra resolver essa questão. Quer dizer, mais ou menos, já que os "inhos" ainda são bem populares, e o Fabinho nem tanto. Curiosidade: o Reinaldinho e o Bernardinho Tigre-Verde são referências a roteiristas da MSP.


Trecho da história "Um par para a Mônica" - Mônica 1ª série nº 15


Agora, se o nome do menino termina em "ão", já sabemos que ele vai ser um valentão grandão e malvadão. O maior representante dessa classe é o Tonhão da rua de baixo.


Por mais que tenham sido criados para executar sempre a mesma função narrativa, com o passar dos anos Denise, Carminha, Fabinho e Tonhão deixaram de ser uma mera escada para o crescimento dos protagonistas, sendo até mesmo desenvolvidos (em maior ou menor grau) durante a primeira série de TMJ. Tudo bem, eu nunca vi muita evolução do Fabinho Boa-Pinta e do Tonhão nem mesmo na turma clássica, mas não posso dizer isso das outras duas. Atualmente a Denise se destaca como uma das personagens favoritas de uma boa parcela dos fãs, graças ao desenvolvimento feito pelo Emerson. A Carminha também está deixando de ser aquela menina unidimensional, que nunca mostra outras características além da vaidade e prepotência. Hoje há quem defenda que ela é mais do que uma garota mimada ou até torça para que ela forme um par romântico com o Do Contra.


Trechos das TMJ 09 e 57 - 1ª série


A evolução desses quatro nunca teria acontecido se até hoje fossem usados personagens descartáveis no lugar deles. Além de tornar o elenco mais diverso e potencialmente mais representativo, criar e usar personagens fixos possibilita a abordagem de novos temas e enriquece a trama. Outros exemplos de "tapa-buracos" que foram aprofundados com o passar do tempo são a Carmem da esquina (a vizinha mal humorada) e o Seu Juca (o proletário que sofre nas mãos dos quatro principais).


Deixando de lado as histórias da turminha, vamos dar uma olhada nos outros núcleos da MSP. A turma do Chico também usufrui de vários figurantes pelas mesmas razões que eu expliquei acima. Ainda assim, os personagens definidos são bem usados, o que reduz a necessidade de utilizar personagens descartáveis. Hiro e Zé da Roça sempre dão as caras quando o roteiro pede um amigo secundário pro Chico, mesmo que eles fossem os protagonistas lá nas tiras de jornal. O Genesinho é usado de maneira similar ao Fabinho. Até as assombrações costumam ser as mesmas.


Nesse quesito, os núcleos do Bidu, Piteco, Papa-Capim e Turma da Mata são parecidos com o do Chico: secundários fixos e descartáveis utilizados mais ou menos na mesma medida. Antigamente o Horácio interagia com mais figurantes (fixos ou não), mas hoje em dia ele anda mais solitário.


A TMJ tem sua parcela de personagens descartáveis (do sexo feminino, na maior parte das vezes), como é o caso da Nina, Amanda e Mila (elas aparecem nas edições 46, 54 e 71 da 1ª série, respectivamente). O trecho ao lado foi tirado da TMJ 85 - 1ª série.


Confesso que ainda não li todas as edições de CBM, mas até onde eu sei os personagens fixos criados especialmente para esse título foram abordados de maneira bem superficial (com exceção da Fran). Além disso, o Chico costuma enfrentar novas assombrações toda hora, e nunca vi nenhuma delas retornar.


O núcleo do Astronauta provavelmente é o que mais usa personagens descartáveis, mas nesse caso faz sentido. A família dele, os amigos de Tangará e até mesmo a Ritinha não aparecem com tanta frequência assim, mas não vejo isso como um problema. Seria estranho se o Astronauta passasse mais tempo na fazenda do que na sua nave, (assim como é estranho o Chico moço ficar mais tempo na roça do que na faculdade). O protagonista é um explorador espacial que está sempre conhecendo novos planetas e civilizações, e é normal que ele nunca mais as veja, considerando a infinitude do universo. Também é comum ter histórias que abordam a solidão do herói, e aí não tem ninguém mesmo.


A turma do Penadinho também tem incontáveis figurantes descartáveis, e mais uma vez isso faz sentido. É necessário criar personagens novos toda vez que a Dona Morte vai buscar alguém. Apesar disso, a turma fixa do cemitério é bem rica e aparece constantemente nas histórias.


Se as turmas do Penadinho e do Astronauta têm muitos personagens vapt-vupt, a turma da Tina vem logo atrás. Juntos, ela e o Rolo já namoraram toda a população brasileira e ainda pegaram uns gringos de sobra. Pra ser sincera eu até estou na dúvida se a Dona Morte realmente já levou mais gente do que a Tina namorou (fica aí o questionamento). Acredito que a inconstância amorosa dos protagonistas é muito explorada, em detrimento do quadro de personagens fixos, que é pouco conhecido.


Encerro esse post com um questionamento: no bairro do Limoeiro, quem é você? O protagonista que chama atenção por onde passa; o secundário discreto, porém mais amado do que o principal; ou o figurante que sempre rouba corações, mas some na multidão? Independentemente do papel, todos têm o seu valor na narrativa.

2 Comments


Gustavo Botassini
Gustavo Botassini
Aug 05, 2021

Ótimo conteúdo! Continue com o bom trabalho que os resultados vêm! Não pare de divulgar, envie em todas as redes sociais!

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Micaela Crispim
Micaela Crispim
Aug 06, 2021
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Obrigada pelo seu comentário, Gustavo! Fiquei muito feliz com a sua mensagem, valeu pelo apoio! :D

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